Transformadores planares são dispositivos magnéticos utilizados para isolar ou converter níveis de tensão, assim como os transformadores convencionais, mas com uma grande diferença: seus enrolamentos são feitos em camadas de trilhas condutoras diretamente sobre uma placa de circuito impresso (PCB – Printed Circuit Board). Em vez de fios de cobre enrolados ao redor de um núcleo, os transformadores planares usam padrões de trilhas condutoras, empilhadas em múltiplas camadas e separadas por dielétricos, formando um sistema compacto, eficiente e plano.
Vantagens principais:
- Perfil baixo: Como não há bobinas salientes, o transformador pode ser embutido na PCB, ideal para dispositivos com restrições de altura.
- Alta eficiência: A proximidade entre as camadas de enrolamento reduz significativamente a indutância de fuga.
- Boa dissipação térmica: A área superficial maior permite que o calor seja distribuído e dissipado com mais eficácia.
- Baixa capacitância parasita intra-enrolamento: Quando bem projetado, o arranjo reduz acoplamentos indesejados entre segmentos de um mesmo enrolamento.

Desvantagens e desafios:
- Capacidade de corrente limitada: As trilhas devem ser suficientemente largas para conduzir corrente com segurança, mas isso ocupa espaço.
- Relação de espiras restrita: A geometria da placa limita o número de voltas possíveis.
- Capacitância parasita entre enrolamentos: O empilhamento das trilhas em camadas diferentes pode aumentar o acoplamento capacitivo, afetando o desempenho em altas frequências.
- Custo de fabricação: Como envolve múltiplas camadas e precisão no layout, os transformadores planares exigem maior investimento no projeto e na produção da PCB.
Aplicações típicas:
Transformadores planares são usados principalmente em fontes chaveadas (SMPS – Switched Mode Power Supplies), conversores isolados DC-DC, inversores e em qualquer sistema que exija compactação, desempenho térmico e eficiência elevada, como em equipamentos médicos, aeroespaciais e telecomunicações.
Como Criar Transformadores Planares em PCBs – Projeto no Layout da PCB
Como projetar um transformador planar na PCB?
Ao contrário dos transformadores convencionais, onde os enrolamentos são feitos com fios de cobre ao redor de um núcleo, o transformador planar é desenhado como parte do próprio circuito impresso. Isso significa que os enrolamentos são formados por trilhas de cobre distribuídas entre camadas da placa, conectadas por vias (furos metalizados que interligam camadas).

1. Definição do núcleo magnético
O primeiro passo é escolher o tipo e o formato do núcleo magnético. Os transformadores planares geralmente utilizam núcleos de ferrite em formatos específicos (como ER, ETD, E ou planar customizado) com recortes que permitem envolver fisicamente a região da PCB onde estão os enrolamentos. O núcleo é fixado em torno da região da placa projetada para o transformador, formando o caminho magnético fechado.
A escolha do núcleo influencia:
- A permeabilidade magnética (μ)
- O volume do núcleo e sua capacidade de armazenar energia
- As perdas magnéticas, que afetam a eficiência
2. Desenho dos enrolamentos
Cada enrolamento (primário, secundário ou terciário) é desenhado como uma espiral ou forma de anel nas trilhas de uma ou mais camadas da PCB. Algumas práticas importantes:
- Enrolamentos concêntricos: os enrolamentos são sobrepostos entre camadas, com interconexões por vias.
- Espessura da trilha: deve ser dimensionada de acordo com a corrente a ser conduzida, conforme norma IPC-2152.
- Largura mínima entre trilhas: deve considerar a tensão entre os enrolamentos, para evitar arco elétrico.
Fórmulas envolvidas:
- Resistência das trilhas: \[R = \frac{\rho \cdot l}{w \cdot t}\] Onde:
- R = resistência da trilha
- ρ = resistividade do cobre (≈ \(1.68 \times 10^{-8} \ \Omega \cdot m\))
- l = comprimento da trilha
- w = largura da trilha
- t = espessura do cobre
- Indutância aproximada de uma espira plana circular: \[L = \frac{\mu_0 \cdot N^2 \cdot r_{\text{médio}}}{2}\] Onde:
- L = indutância
- \(\mu_0\) = permeabilidade do vácuo (4π×10−74\pi \times 10^{-7}4π×10−7)
- N = número de espiras
- \(r_{\text{médio}}\) = raio médio da espira
3. Empilhamento e dielétrico entre camadas
A espessura do dielétrico (o isolante entre as camadas condutivas) é um dos parâmetros mais críticos. Ela determina:
- A capacitância parasita entre enrolamentos (afetando o comportamento em alta frequência)
- A resistência dielétrica (tensão máxima que pode suportar sem ruptura)
- A capacidade de dissipar calor
Capacitância parasita entre enrolamentos:
\[C = \frac{\varepsilon_r \cdot \varepsilon_0 \cdot A}{d}\]
Onde:
- C = capacitância parasita
- \(\varepsilon_r\) = permissividade relativa do dielétrico
- \(\varepsilon_0\) = permissividade do vácuo (\(8.854 \times 10^{-12} \ \text{F/m}\))
- A = área de sobreposição das trilhas
- d = espessura do dielétrico
4. Frequência de operação
Transformadores planares são otimizados para trabalhar em altas frequências (normalmente de 100 kHz até alguns MHz). Em tais frequências:
- A indutância de fuga deve ser minimizada para manter o acoplamento magnético.
- A capacitância parasita pode formar ressonâncias indesejadas.
- Efeitos de pele e de proximidade aumentam a resistência AC da trilha, exigindo ajustes na largura e no tipo de trilha (ex: uso de trilhas paralelas ou cobre espesso).
Como Criar Transformadores Planares em PCBs – Fabricação, Simulação e Considerações Térmicas
Fabricação do Transformador Planar
Diferentemente de transformadores tradicionais, que exigem enrolamento manual ou automatizado com fio de cobre, o transformador planar é inteiramente fabricado junto com a placa de circuito impresso (PCB). Isso significa que:
- Os enrolamentos são produzidos por processos fotolitográficos e de deposição de cobre em múltiplas camadas da PCB.
- As interligações entre camadas (vias) devem ser dimensionadas corretamente para a corrente que irão conduzir.
- A escolha do empilhamento (quantas camadas e sua espessura) impacta diretamente no desempenho elétrico e térmico.
Desafios da fabricação:
- Registro de camadas: alinhamento preciso entre camadas é essencial para manter o acoplamento magnético entre enrolamentos.
- Custo: placas multicamadas com dielétricos especiais e cobre espesso (por exemplo, 2 oz ou mais) aumentam significativamente o custo da fabricação.
- Espaçamento e isolamento: as distâncias entre trilhas e camadas devem seguir normas como a IPC-2221, principalmente quando há diferenças de potencial significativas entre primário e secundário.
Simulação Eletromagnética
Antes de produzir fisicamente o transformador planar, é altamente recomendável fazer a simulação de seu comportamento eletromagnético. Ferramentas como COMSOL Multiphysics, Ansys Maxwell ou mesmo simuladores integrados a plataformas ECAD como o Altium podem ser utilizadas.
O que simular:
- Distribuição do campo magnético
- Indutância de magnetização e de fuga
- Capacitância parasita entre camadas
- Distribuição térmica durante operação
- Efeitos de corrente parasita (eddy currents)
Essas simulações ajudam a prever:
- A eficiência do transformador
- A estabilidade térmica em regimes contínuos e pulsados
- A frequência de ressonância provocada por elementos parasitas (como capacitâncias entre enrolamentos)
Dissipação de Calor e Térmica
Transformadores planares têm a vantagem de espalhar o calor sobre uma área maior, facilitando a dissipação. Ainda assim, é essencial considerar:
Fatores térmicos importantes:
- Potência dissipada (\(P_{\text{loss}}\)): \(P_{\text{loss}} = I^2 \cdot R_{\text{AC}} + P_{\text{núcleo}} + P_{\text{dielétrico}}\)\) Onde \(R_{\text{AC}}\) é a resistência da trilha à frequência de operação.
- Temperatura máxima da placa (hotspot): deve estar abaixo da temperatura de degradação do dielétrico e das soldas (~130°C a 180°C, dependendo do material).
- Estratégias para controle térmico:
- Inserção de thermal vias (vias térmicas) sob os enrolamentos.
- Uso de planos de cobre conectados ao GND como dissipadores.
- Se necessário, aplicação de dissipadores metálicos no topo do núcleo.
Importância do controle térmico:
O calor excessivo pode degradar os dielétricos, causar delaminação da placa e até provocar falhas dielétricas entre enrolamentos, especialmente em aplicações de alta tensão.
Como Criar Transformadores Planares em PCBs – Dimensionamento Elétrico
1. Definindo a Relação de Espiras (\(N_p:N_s\))
A razão entre o número de voltas no enrolamento primário (NpN_pNp) e no secundário (NsN_sNs) determina a conversão de tensão entre entrada e saída. Para um transformador ideal: \[\frac{V_s}{V_p} = \frac{N_s}{N_p}\Onde:
- \(V_p\) = tensão no primário
- \(V_s\) = tensão no secundário
- \(N_p\) = número de espiras do primário
- \(N_s\) = número de espiras do secundário
No transformador planar, o número de espiras é limitado pelo espaço disponível e pela largura mínima da trilha para a corrente desejada. Por isso, é comum adotar relações como 1:1, 2:1 ou 3:1.
2. Cálculo da Indutância de Magnetização (\(L_m\))
A indutância de magnetização define a capacidade do transformador de armazenar energia no campo magnético. Para enrolamentos planos sobre núcleo magnético, podemos usar a fórmula clássica: \[L = \frac{N^2 \cdot \mu \cdot A_e}{l_e}\]
Onde:
- L = indutância (H)
- N = número de espiras
- \(\mu = \mu_r \cdot \mu_0\) = permeabilidade magnética total
- \(A_e\) = área efetiva da seção transversal do núcleo (m²)
- \(l_e\) = comprimento efetivo do caminho magnético (m)
A área AeA_eAe e o comprimento lel_ele são fornecidos no datasheet do núcleo de ferrite usado (por exemplo, ER cores, E cores, ETD cores).
3. Corrente e Largura das Trilhas
A corrente máxima que cada enrolamento pode suportar está diretamente relacionada à largura da trilha. Conforme a norma IPC-2152, a largura www para uma corrente III segura é dada por gráficos ou calculada aproximadamente por: \[w = \frac{I}{k \cdot \Delta T^b}\]
Onde:
- w = largura mínima da trilha (mil ou mm)
- I = corrente desejada (A)
- \(\Delta T\) = aumento de temperatura permitido (°C)
- k e b = constantes obtidas experimentalmente (por ex., para trilhas internas: \(k=0.024, b = 0.44\))
Exemplo: Para 2 A de corrente com aumento térmico de 20°C e cobre de 1 oz (35 µm), a largura mínima da trilha interna seria de aproximadamente 0,5 mm.
4. Tensão de Isolamento entre Camadas
O dielétrico entre enrolamentos primário e secundário deve suportar a tensão de isolamento especificada. A norma IEC 60950 recomenda:
- Para isolamento funcional: 0,5 mm
- Para isolamento básico: 1,0 mm
- Para isolamento reforçado: 2,0 mm ou mais
A escolha do material dielétrico da PCB (como FR4, polyimide, Rogers) afeta diretamente a rigidez dielétrica (tipicamente 20–50 kV/mm).
5. Frequência de Operação e Núcleo
Transformadores planares são mais eficientes em frequências acima de 100 kHz. Quanto maior a frequência, menor precisa ser a indutância, o que permite usar menos espiras.
Porém, aumentar a frequência também aumenta as perdas no núcleo (histerese e correntes parasitas), por isso:
- Ferrites como 3C90, N87 ou KoolMu são recomendados.
- A área efetiva do núcleo deve suportar a densidade de fluxo magnético abaixo de \(0,3\ \text{T}\) para evitar saturação.
Como Criar Transformadores Planares em PCBs – Parte 5: Exemplo Prático e Conclusão
Exemplo Prático: Projeto de um Transformador Planar 12V → 5V, 2A
Vamos considerar um conversor isolado com entrada de 12V e saída de 5V a 2A, operando a 250 kHz. Desejamos projetar um transformador planar integrado à PCB para essa função.
1. Definindo a Relação de Espiras
Desejamos uma conversão de 12V para 5V, com alguma margem para perdas no controle PWM. Vamos adotar: \(\frac{N_s}{N_p} = \frac{5}{12} \approx 0{,}416 \Rightarrow \text{Ajustamos para uma relação 5:12 ou 2:5 (N_p = 5, N_s = 2)}\)
2. Selecionando o Núcleo
Escolhemos um núcleo do tipo ER18/3.5 (comum em fontes chaveadas de pequeno porte), que possui:
- Área efetiva: \(A_e = 22 \times 10^{-6}\ \text{m}^2\)
- Caminho magnético efetivo: \(l_e = 38 \times 10^{-3}\ \text{m}\)
- Permeabilidade típica: \(\mu_r \approx 2000\)
Calculamos a indutância desejada para o primário com 5 voltas, visando armazenar energia suficiente sem saturar: \[L = \frac{N^2 \cdot \mu \cdot A_e}{l_e} = \frac{25 \cdot 4\pi \cdot 10^{-7} \cdot 2000 \cdot 22 \cdot 10^{-6}}{38 \cdot 10^{-3}} \approx 0{,}91\ \text{mH}\]
3. Corrente e Largura de Trilhas
Para 2 A no secundário, com cobre de 1 oz e aumento térmico de 20°C, usamos o guia IPC-2152 e obtemos:
- Largura mínima para trilha interna: 0,6 mm
- Espessura do cobre: 35 µm (1 oz)
4. Capacitância Parasitária
Vamos estimar a capacitância entre o primário e o secundário. Suponha:
- Área sobreposta entre trilhas: \(A = 300 \ \text{mm}^2 = 3 \times 10^{-4} \ \text{m}^2\)
- Espessura dielétrica \(d = 0{,}1\ \text{mm}\)
- \(\varepsilon_r = 4{,}5\)
\[C = \frac{\varepsilon_r \cdot \varepsilon_0 \cdot A}{d} = \frac{4{,}5 \cdot 8{,}854 \cdot 10^{-12} \cdot 3 \cdot 10^{-4}}{1 \cdot 10^{-4}} \approx 120\ \text{pF}\]
Esse valor é aceitável para frequências até 250 kHz, desde que não afete o controle do chaveamento.
Conclusão e Recomendações Finais
Projetar um transformador planar diretamente em uma PCB é uma estratégia avançada que combina conhecimento em eletromagnetismo, engenharia térmica e design eletrônico. Quando bem executado, esse tipo de transformador oferece:
- Alta eficiência (>99%)
- Integração ao layout
- Redução de tamanho vertical
- Excelente dissipação térmica
Entretanto, é necessário:
- Atenção às normas IPC (2152 e 2221) quanto à corrente, isolamento e largura de trilhas
- Verificação rigorosa por simulação eletromagnética e térmica
- Planejamento do empilhamento da placa, incluindo a seleção correta de materiais dielétricos
Esse conhecimento é especialmente útil em fontes chaveadas isoladas, conversores flyback e forward, circuitos médicos, aplicações automotivas e sistemas de potência embarcados.